Hoje em dia está parada
nem pode ser comparada
com tempos que já lá vão;
vinham de longe os tendeiros
os do cebolo, os gigueiros
era mesmo um feirão!
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Já não temos limonada
as vacas e a guisalhada
num tim-lim-lim todo o dia;
a farmácia que ficava
muito mais do que lotada
tal era a pancadaria!
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Já não é como era dantes
eram muitos os feirantes
sempre grande falatório;
lembro a velha que dizia
ao longo de todo o dia
merca-merca um reportório!
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O funileiro, a louceira
já não se vêm em Nespereira
já ninguém lhe põe a vista;
o que está a dar hoje em dia
é ir à pastelaria
e mandar vir tosta mista!
Desde a demolha ao ripanço
das barrelas ao tear;
podem crer, nunca me canso
desta cultura falar
Sabia tão bem ficar
à espreita, estarrecido;
e por de trás do tear
ver o linho ser urdido
Só que agora a tecedeira
sabe também como eu;
falar do linho em Nespereira
só pode ser no museu!
está a dois passos da Feira
num casarão bem velhinho;
mas é ali que Nespereira
pode fazer culto ao linho!
Decorria o leilão de oferendas antes arrecadadas pelos moradores dos lugares da Feira, Vista Alegre e Feira Franca, já com os tractores alinhados, foi bonito ver quanto público se juntara em redor do palanque. tal ponto que deu em aquecer o ambiente, não tanto por acção do astro-rei – às três da tarde o termómetro tinha subido de rompante, apanhando desprevenido quem não cuidou em deixar alguns trapos no cabide – também devido aos inevitáveis “picanços” a respeito do valor das cestas, em cujo recheio pontuava o inevitável e chamativo fumeiro. De entre o que se tinha arrecadado com vista a minimizar os encargos contraídos com a construção do emblemático Lar de Solidariedade Social, faziam parte frangos e mais frangos, coelhos e até alguns exemplares de ovinos, uns e outros a arfar, de boca aberta e nada satisfeitos pela prolongada seca a que foram submetidos.
Alheio a tudo isso, ficara naturalmente o leiloeiro, também os responsáveis e colaboradores de ocasião, bem mais interessados em ver subir a fasquia no número dos euros arrecadados. Sobressaiu, por isso, a chegada do popupar “engenheiro”. No seu jeito brincalhão, simulando ter ou já dono da habitual “carraspana”, abeirou-se de quem geria o fulgor da festa, formulando um pedido que a ter por autor um Engenheiro…sem aspas, mereceria a imediata aceitação: “toca a leiloar a bicharada que os salpicões não têm sede e podem esperar”! Nem mais!
Se calhar por força da profissão que exerce, a Enfª Fátima cuidou em tirar o gargalo a uma garrafa de plástico que tinha à mão, sendo notória a pressa que os galos tiveram em humedecer o gasganete. Resultara o alvitre!
Tão satisfeito quanto os galos, ficara o Engenheiro…com aspas, credor da admiração manifestado por vários dos presentes. Na oportunidade, a muitos não passou desapercebida a nobre atitude de um Homem simples e a cada passo apelidado de isto e daquilo por alguns cuja conduta jamais comportaria o alívio dos assarapantados franganotes e quejandos.
Mãe
Queria falar mas sou mudo|
A Mãe é mais que um dia
É noite
É vida
É tudo!...
Mãe é vida
Mãe é esperança
Poço de amor sem ter fundo;
Qual maravilha escondida
Que a mim não vem à lembrança
E nem deve haver no mundo!
E neste dia que passa
O ter e ser Mãe é graça
Tão grande, tão valiosa;
Por isso Mãe, aqui tens
Com um beijo de parabéns
Esta pequenina rosa!
Hoje apetece-me recordar o tempo quando a moçarada passava a penates ao casario do lugar do Cancelo ou à porta da Quinta do Cadafaz a caminho de Alvarenga para ver hora e meia de pontapé para a frente; ao mesmo tempo, voltar a falar dos bravos nespereirenses que demandavam Regoufe e Rio de Frades, outras vezes as minas do Pejão em caminhadas que duravam sete e mais horas. Podia relembrar também o tempo em que as mulheres demandavam o Grou e de lá traziam grandes molhos de lenha destinados a atiçar o fogo nos fornos das doceiras de então. Podia…mas para quê?... relatar tantos casos de vida que hoje em dia a ninguém passa pela cabeça. Fala-se à boca cheia de crise, mas que razões não teriam as gentes dos anos cinquenta, sessenta e por aí?!... Por certo razões para falar de fome que nalguns casos, dizia-se, era de esganar. Podia falar, enfim, dos colchões de grêta que, ciclicamente, açambarcavam palha até dizer chega, mesmo assim tão confidentes ou mais do que são agora os modernos “molaflexes”. Podia trazer à baila as camisas de talas ou as calças de fiôco que estalicavam à medida que o tempo corria. Podia isto e aquilo, mas fico-me por mais estes dois apontamentos: as calças de racha aberta, com o propósito de facilitar a vida por alturas do “faz caquinha” e a gostosa visita de um vendedor de limonada, munido do canado revestido a cortiça “pamorde agantar o sol do meio dia”, sendo que cada coco custava um tostão e só os mais endinheirados desfrutavam do “pirolito de bola”, um refresco gasoso que se vendia em garrafas de vidro e em cuja abertura reinava o dedo indicador que então substituía o actual abre-latas. Hoje em dia, porque quem reina é a ”mini” ou a reles “sevanepe”, sabe-me bem reviver tais andanças e desabafar: viva o futuro, mas enquanto puder, dizer também viva o passado!
Salgadeira atestada
cebolas para o ano inteiro;
a terra bem ajeitada
que ele não quer nem por nada
deixar de ser bom caseiro!
Vêm à Feira, raramente
rico par, como os que o são:
ele mandão, é exigente
figos, pão e aguardente
fazem sempre um figurão!
Quatro rasas de feijões
e vinte alqueires de milho;
também têm ilusões
e nos lençóis emoções
no fazer de mais um filho.
Na lufa do dia a dia
quando se pára um bocado
tem lugar a nostalgia
ao recordar o passado
do passado tenho pena
tenho pena de não ver
no nosso bonito Ardena
a cultura do lazer!
Como a cultura do linho
que de alto a baixo fazia
com que o vale ribeirinho
fervilhasse de alegria
Hoje resta recordar
pouco mais fazer eu posso
mas posso e devo falar
viva o Ardena que é nosso!
Vem-me à idéia a cada passo
quando do pinhal do Paço
assistia à romaria;
junto à igreja, gente fina
aplaudia a "Jaquina"
e era assim todo o dia!
Corria o tempo da tropa
agarradinho à cachopa
fazendo juras seguidas;
ficava ali consolado
só vinha p'ró outro lado
na hora das despedidas!
Que aconteciam na hora
quando a banda de fora
se afoitava ao caminho;
e já da moça liberto
tinha de ir, isso era certo
beber um copo ao Zezinho!...
Há dias, numa das minhas saltadas à urbe tripeira, estive à conversa com uns amigos e à baila veio o desencanto de um deles, ao constatar que os responsáveis da CP, da Refer ou lá o que seja, deram em fechar linhas ferroviárias a torto e a direito, ao que parece escudados no pretexto de que as ditas estavam longe de ser rentáveis. Mais concretamente, não davam o lucro que os homens do mando tanto apreciam, alfobre de chorudos ordenados e avultados prémios. Um outro ajuntava que, em contrapartida, em redor da nossa querida e tão apaparicada capital, os traçados são melhorados, as carruagens são substituídas por outras mais actualizadas e os horários - não fosse os já favorecidos "capitalistas" ficarem insatisfeitos - são cada vez menos compassadas, passando nalguns casos de sete para cinco minutos ou até menos. Falamos também que a região do Porto teve há pouco tempo o "desougo" de uma linha reactivada: Campanhã (ou Ermesinde) até Leixões, via S. Mamede de Infesta. Um percurso com velhinhas estações, mas alindadas com valiosos azulejos, encomendados a propósito pela CFE-Companhia de Ferro do Estado (nos anos 30 do século passado era esta a designação). Foi assim que relembrei o que já dias antes tinha lido nos jornais. Daí que, finda a conversa e porque o regresso a Nespereira só aconteceria ao findar do dia, lá fui eu, dar lustro ao gosto que sempre tive: viajar de comboio. Com a pressa possível, tratei de adquirir o indispensável título de transporte, ouvindo anunciar a partida daí a instantes. Em três tempos estava dentro de uma das três modernas carruagens, questionando-me de imediato se tinha ou não entrado num comboio a caminho...da recolha. Com efeito, se calhar porque a renovada ligação não passa de Leça do Balio e só mais lá para a frente chegará a Leixões, deu para cavaquear com o revisor, também ele a contas com um certo enfado, já que de passageiros, para além do signatário, seguia apenas um casal de fora, interessado em ver o mosteiro de Leça do Balio.
Mas que politicas são estas que apontam para o fim do comboio no lindíssimo troço do Tua, resolvem não prosseguir com a restauração na linha do Douro até ao Pocinho e travam outras ligações, sujeitando quem mora no interior ao compulsivo marasmo.
Já no decorrer da viagem de regresso, lembrei-me do que fariam o Zé do Telhado ou o Robin dos Bosques!... Se calhar por tal, de noite "vi" muitos nespereirenses a contas com alguns carris às costas e outros tantos ou mais com as necessárias travessas prontas a assentar. Ao
certo, não me lembrava como tinha sido possível o comboio transpor a ponte da Bateira, bem como contornar o pontão de Vila Viçosa, em curva acentuada.
À minha mente vinha a triunfal entrada de uma moderna carruagem na nossa freguesia, com o pessoal todo alinhado a "ver passar os comboios"...
Bastou a habitual chegada da padeira mais o sinal que deixa no portão. Desperto, dei conta de que o saldo se assemelhava ao que normalmente obtenho do que invisto no euromilhões. Vi que outro remédio não tenho, como aliás acontece a quantos moram na Vista Alegre, por exemplo, que não seja o de dar força aos calcantes na íngreme subida que dura quinze ou mais minutos.
Raio de sonho!
A determinada altura, dei por acertado julgar que as gentes de agora tinham por principal preocupação abancar em determinados estabelecimentos cá da terra e toca de mandar vir, entre outras petisqueiras, a apetitosa tosta mista. Terá sido - e disso me penitencio agora... - um julgamento algo apressado e prova de tal conclusão, é o que agora dou à estampa. Na verdade, quase que de um dia para o outro, como que fugindo por água abaixo, vi desaparecer a imagem por muitos formulada ao longo de anos a fio, a qual, se não crucificava a presente geração, em nada era abonatória quanto à vontade de "vergar a mola" no preparo dos mimos da horticultura ou no amanho das leiras herdadas dos "velhos", muitas delas já a monte...
De um dia para o outro, bastou o início dos trabalhos da ligação à futura escola do Borralhal, sendo que logo nas primeiras horas, dava gosto ver muitos nespereirenses apostados em disputar a terra que importa retirar do local. Carretas, carrinhas e tractores, depressa enxamearam as cercanias da Feira, deixando por todo o lado as amostras do "ouro" que antes tinham carregado.
Porque não me parece que tal se fica a dever à moderna directriz dos médicos na qual recomendam que se faça exercício físico, não deixa de ser um sinal claro dos tempos que correm. Ao fim e ao cabo, se calhar está aí o corroborar do presságio de quem no início da crise que nos tem sacudido, fez questão de sentenciar que todas as belgas e leiras iriam ser cultivadas mais dia menos dia.Sabemos que muitos adeptos tem o sistema de comer fácil e limpinho.
Mesmo assim, aí está o que pode ser considerado como sendo o tal sinal. O sinal dos tempos.